Havia algum tempo já separado alguns objetos depois daquelas mega-arrumações que todos nós fazemos, isso vai ali, esse é pra jogar fora, aquele livro é presente para o Zeca, aquele xerox tenho que devolver a Lígia e esses são os próximos livros que pretendo ler, dentre eles, Budapeste, de Chico Buarque.
O livro, presente de minha amiga Luciana, me aguardava há seis anos. Não é preguiça de ler, é desconfiança. Quer dizer, era. Sempre fico com uma pulga atrás da orelha quando alguém se aventura por outras áreas, mesmo sendo o Cara. De Chico, havia lido Estorvo, mas na época lia pensando em acabar logo, chegar à última página rapidamente, prestar atenção somente na história, sem me dar conta do estilo, da poesia na prosa, do uso perfeito de determinada palavra dentro daquela frase. Como pude desconfiar de Chico, sendo que ele faz letras e melodias maravilhosas?
Por ser escrito em primeira pessoa, pequei em imaginar no personagem o próprio Chico. Mas, para quem compôs Partido Alto, "Deus me fez um cara fraco, desdentado e feio, pele e osso simplesmente", sendo o oposto, deveria dar ao personagem outra cara.
Estava sem rumo, as aulas adiadas para evitar contaminação de gripe, um restinho de férias do trabalho e não podia adiar mais. O livro e o xerox foram entregues prontamente, mas Budapeste me encarava, "e aí, vai ler ou não vai"? Sim, vou, seria muita desfeita com um presente ganho por amiga tão querida. Comecei em uma noite. Já gostei de primeira página. Não conseguia desgrudar os olhos. Desta vez, consegui distinguir Chico do personagem principal. Na cozinha os gatos miavam de fome, seus potes de ração vazios, "só mais esse capítulo", dizia, mas não me entendiam, queriam comida.
Dei pausa na leitura e percebi que também estava com fome. Deixei para o dia seguinte a continuação. Ao finalizar a obra, tive que dar o braço a torcer, Chico é gênio e tudo que toca se transforma em ouro. Ainda me faltam Benjamin e Leite Derramado, este último, dei de presente a minha mãe que me disse, "é maravilhoso, mas estou lendo aos poucos para não acabar logo". Se fosse eu, lia tudo de uma vez e se achasse ótimo, recomeçaria de novo. Chico fez o caminho inverso de Vinícius de Moraes, da música para a Literatura. Ambos brilhantes.
Um comentário:
Eu tenho medo desses olhos...
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