Dois mil e dezoito

10.5.18
Quase cinco anos sem escrever aqui, vamos a um breve resumo. Comecei a trabalhar em dois colégios particulares em 2013 e em dois públicos. Larguei três, fiquei com um somente até 2016 e agora, em 2018, a pedido da coordenação, voltei!

Porém, o que deixei de contar foi o porquê de ter deixado as aulas e ficar dois anos sem lecionar. É que em 2015 meu filho, Fernando, nasceu! Em um belo dia de março, quando ele ainda dormia, saí para trabalhar e percebi que só o veria novamente à noite. Então, fiquei somente com o emprego da tarde.

Acredito que deixei de escrever aqui porque as aulas estavam tomando tempo, as prioridades eram outras e por fim, quem hoje em dia lê blogs que não sejam políticos? Atualmente, a galera lê e escreve textões no Facebook...


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É hora de voltar

24.8.13


Já estava na hora, meu povo, quase um ano sem atualizações. Explicações? Nenhuma convincente, apenas que estou dando muitas aulas e isso toma muito tempo, além da criatividade.

Em breve, novos textos... ou não!
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A Física e a Gramática

22.10.12


De uma forma bem simples, farei a comparação entre Física e Gramática Tradicional, também conhecida por Normativa ou Prescritiva. Os físicos observam o comportamento de um objeto em determinadas condições, fazem experimentos, testam, descrevem fenômenos até formular “regras” ou “leis” que se repetirão naquelas mesmas condições. Os gramáticos tradicionais, por outro lado, não observam como as pessoas falam ou escrevem. Eles ditam regras estilísticas de como os falantes devem utilizar a linguagem. Ditam normas que serão impostas em aborrecedoras aulas de Língua Portuguesa.

Porém, ao contrário dos gramáticos tradicionais, os linguistas tentam formular regras descritivas que expressam generalizações e regularidades sobre vários aspectos de uma língua. Ou seja, como fazem os físicos e demais cientistas, observam, no caso, a maneira como as pessoas utilizam a linguagem, sem se importarem se estão de acordo com o que dita a Gramática Normativa. A Linguística é uma ciência nova perto da Física, e por isso, ainda encontra obstáculos em sua aceitação.

A Física não quer prescrever como os corpos devem se comportar. “A partir de hoje, fica instituída a proibição da inércia ou a queda livre”. Isso é tão absurdo, mas não nos parece estranha a ideia de se impor regras estilísticas para a fala ou para a escrita. Isso ocorre porque durante muitos anos, a Gramática Tradicional ocupava grande parte das aulas de Língua Portuguesa. Além disso, as pessoas, apoiadas nessas tradicionais aulas, têm o costume de corrigir os demais falantes e de taxar de ignorante aquele que não segue as regras impostas pela Gramática Normativa.

As regras prescritivas determinam o modo como o falante supostamente deveria falar ou escrever para parecer correto ou culto. As regras prescritivas, assim, são regras estilísticas e não gramaticais. A classe dominante utiliza a norma culta por dar mais status, ao contrário da variante popular. Vira uma forma de segregação, apoiando-se entre outros fatores, no modo como as pessoas se comunicam. A norma culta é necessária, mas somente ficar restrito ao ensinamento da mesma é falha. Felizmente muitos educadores, tardiamente, diga-se de passagem, estão se dando conta disso. O problema reside na resistência de se aceitar mudanças no currículo escolar consideradas profundas, tanto pela mídia quanto pela sociedade em geral.

Outra comparação entre Física e norma culta está no fato de não haver uma unidade de medida mais correta que a outra com relação à temperatura. Não podemos dizer que Fahrenheit é mais certa do que Celsius ou Kelvin, simplesmente por se tratarem de convenções adotadas pelos indivíduos. Assim também ocorre com a linguagem, existem padrões diferentes e dizer que um é mais correto do que o outro é a mesma incoerência entre as escalas de medidas de temperatura. As duas variantes, norma culta e popular cumprem com eficácia o seu papel como meio de comunicação. Por isso, não existe uma mais correta do que a outra.


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A cada quatro anos

5.7.12


“As Olimpíadas não são uma manifestação de saúde. São uma exaltação do desejo de ser o maior. Prova disso são os dopings. Os atletas sabem que faz mal à saúde. Pode matar. Mas uma morte prematura bem vale um lugar no pódio!”  Rubem Alves

Acho que era uma propaganda da Sadia, em que algumas crianças brincavam e diziam: “brincando nada, treinando para as Olimpíadas do ano 2000”. Eu adorava ver esse comercial, gostava de acompanhar as competições. Até hoje comentam sobre o encerramento das Olimpíadas de Moscou, em 1980, com o urso Misha chorando. Eu só tinha um ano. Se vi, não me recordo. Claro que posteriormente assisti às imagens. Porém, tudo ficou mais claro quando descobri que havia também uma competição entre Capitalismo e Socialismo, o uso dos atletas pelos governos, numa demonstração de força, de quem era o melhor.

Foram os jogos olímpicos em Los Angeles (1984) que me marcaram, e certamente muita gente, por causa da suíça Gabrielle Andersen-Scheiss. Era a estreia da maratona feminina em Olimpíadas. Gabrielle estava com 39 anos e chegou à reta final sentindo fortes dores e desidratada. Ela não desistiu, porque, como ela mesma disse posteriormente, além de ser a primeira e última vez que participaria de um Olimpíada, já que a idade não permitiria mais, quem aceitasse auxílio dos médicos durante a prova era desclassificado. Após verem todo o sofrimento da atleta, membros da Associação Internacional de Federações de Atletismo (IAAF) criaram o artigo Andersen-Scheiss que permite o atendimento médico aos atletas sem que sejam desclassificados por isso.

Eu gostava muito de ver as competições, de torcer, como escrevi anteriormente, até que percebi ser algo vazio. A IAAF tomou uma atitude somente após Gabrielle chamar a atenção do mundo com o absurdo do tratamento dado aos atletas. Depois de ler a opinião de Rubem Alves sobre os jogos olímpicos, reforcei ainda mais minha ideia. O que se exige do atleta é irracional, a ponto de ele cometer barbaridades. “Uma pessoa que passa dez anos de sua vida treinando seis horas por dia não por prazer, mas para sair da piscina um centésimo de segundo na frente da marca olímpica só pode ter ódio da água. A água é o inimigo a ser vencido (...) Tocada a borda da piscina, para onde olham os nadadores? Olham para o placar onde aparece o tempo”.

E o que dizer dos esportistas que utilizam da desonestidade nas competições, como o doping, um descuido do árbitro ou um pênalti simulado só para ter mais chances de marcar o gol? Será que se sentem orgulhosos, se sentem os melhores? Quando estão sozinhos, e veem a própria imagem, será que a consciência não aponta para um reflexo vazio?
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As mulheres dos Chicos

12.4.12

Lá, em um lugarzinho escondido dos rascunhos de meus posts, achei esse perdido, escrito em 2008. Só não sei por que não havia publicado antes. Reproduzo-o aqui, sem mexer em nenhuma vírgula. :

Todas as quartas-feiras à noite eram iguais. Volume da velha Telefunken quase no máximo, e ai de quem desse um piu. Silêncio total. Barulho, só o da televisão. Parecia até espera de um pronunciamento do Papa ou do presidente, “brasileiras e brasileiros”, com o anúncio de um novo plano econômico. Ou quem sabe até os temidos microfones do plantão da Rede Globo.

Nada disso. Algo mais grave? Errado. Por incrível que pareça, todo o ritual de rodar o seletor de canal até o 12, o botão do volume para cima e o silêncio na sala era para acompanhar um programa de humor. Chico Anysio e sua turma, que não era pequena, causava gostosas gargalhadas em minha mãe. Tempos depois fui saber que todos eram personagens criados e interpretados por ele. “Até a Neyde Taubaté? Mas tinha certeza de que era uma mulher!”

Alguns anos depois, apaixonei-me por outro Chico, o Buarque. Não exatamente por ele, mas por todo o trabalho do homem que é, para mim e para muitos, o maior expoente de nossa cultura. Faz de tudo, assim como o Anysio. Músico, escritor, dramaturgo, até ator já foi o tímido Buarque. Escreve na primeira pessoa o sentimento feminino. Tatuagem, Olhos no olhos, Atrás da porta, Teresinha, Com açúcar, com afeto e A violeira são apenas alguns desses exemplos.

Quando começo a pensar em voz alta sobre alguma obra de Chico Buarque, solto:

– Ah, o Chico é o máximo.

E escuto de meu companheiro Eugenio:

– Quem, o Anysio? Com certeza.

– É, não poderei negar, mas quando falo somente Chico, é o Buarque.

– Já para mim, somente Chico é o Anysio.

Pontos de vista diferentes apenas. Ambos corcordam que os dois Franciscos são exemplos de genialidade, não há dúvida.
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Sonho realizado

11.4.12
Eu, o sax e o gato


Era uma vez eu. E lá, bem lá atrás, quando era apenas uma guria, há mais de vinte anos, queria um saxofone. Achava um instrumento com um som maravilhoso. Mas, caro. Claro, uma pessoa que nem trabalhava ainda, tudo tinha preço alto. Daí, fui deixando passar o tempo, porém, sempre me demorava mais na frente de uma vitrine de instrumentos musicais, olhando para o sax.

Então, fui esperando que o tempo apagasse o desejo de um dia tocá-lo. Mas, juro, volta e meia, enquanto dormia, sonhava que estava tocando.

Hoje, ao completar 33 anos, ganhei de meu marido o instrumento que há muito tempo eu queria. Ainda acho que estou sonhando. Não me lembro de ter expressado para ele um desejo intenso de ter o instrumento. Ele de certa forma percebeu. É assim, não é? As pessoas que se amam se entendem, parece até que telepaticamente.

Obrigada, Eugenio, te amo de montão a ponto de aprender bem a tocar sax e não ferir seus tímpanos nem os do Neko.
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Vantagens da limpeza

3.3.12
Estava eu arrumando várias coisas, organizando papéis, jogando alguns fora e outros tantos que não sei porque, mantive por anos em pastas. Desde os meus 15 anos, anoto poemas de que gosto. Copio de livros em um caderno que agora me desfarei digitando para um documento do Word. Por quê? Ora, para guardar menos entulhos e para facilitar a procura, é só teclar Ctrl + L e digitar uma palavra-chave que encontrarei o poema que desejo reler.

Havia um projeto em Porto Alegre (talvez ainda exista) chamado Poemas no Ônibus em que alguns poemas eram previamente selecionados e fixados nos vidros dos ônibus para que os passageiros lessem. Lembro-me de ter anotado um em meu caderno:


Nunca quis
Que minha vida fosse
Parada, quieta, vazia.
Esse tédio só me agonia
Esse marasmo não me faz bem.

Fico só pensando bobagem
Enquanto o ônibus não vem.

Cezar Dias

Hoje, 14 anos depois, resolvi procurar informações sobre Cezar Dias e encontrei seu blog: http://homenzinhocapenga.blogspot.com/

Gostei muito deste outro poema:

Retorno

a casa da minha infância
fica há quase
40 anos daqui

distâncias de não percorrer
que jeito têm?

há 12 andares
de luxo e sacadas
sobre minha casa de madeira

e sinal nenhum
dos pessegueiros

dia desses
andei andei andei
e (impossível?) cheguei
à casa da minha infância:

foto em preto e branco
num álbum esquecido
dentro do armário

Cezar Dias

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Ela dança no sétimo céu

19.1.12

A letra do vídeo acima é um pedido de desculpa, de pai para filhos, pela atitude que tiveram de tomar em consequência dos anos que passaram durante a ditadura militar. Uma época de preocupações, com a impossibilidade de se saber como seria o dia seguinte e que levava os adultos a viverem em tensão, algo incompreensível para as crianças. A música apresenta metáforas como "a falta de folhas, a falta de ar" representando a ausência de esperança e o sufoco; "quando passarem a limpo, quando cortarem os laços, quando soltarem os cintos, façam a festa por mim", a volta da democracia. Quando foi composta, o país ainda vivia sob intervenção militar. Não se sabia quanto tempo mais essa fase iria durar. A ditadura militar roubou pelo menos 21 anos da vida de muitos brasileiros. A geração seguinte foi livre com liberdade para escrever sobre esse período da história e de qualificá-lo como cruel, duradouro e estúpido. Mesmo assim, depois de tanto tempo, muitos ainda esbarram em fragmentos em que todos, pais ou filhos, podem se machucar.



Há cinco anos, publiquei o texto a seguir sobre Elis Regina no já extinto site Foca Vitulina. Fiz algumas adaptações:

Elis Regina Carvalho Costa, ou somente Elis Regina como ficou conhecida pelo grande público, sintetizou várias qualidades em uma só pessoa. Deus ao criá-la colocou em sua garganta um timbre maravilhoso. Bastava isso, mas para ela não. E Elis aperfeiçoou seu dom. Manteve a voz sempre afinada, escolheu repertórios de qualidade e muitas vezes difíceis de se cantar. Transitava do agudo para o grave como se fosse a coisa mais fácil do mundo. Postava-se no palco como ninguém. Não apenas cantava, mas interpretava as mais belas canções da Música Popular Brasileira. Cantou também em Francês, Alemão, Inglês, Espanhol e Italiano. A letra a guiava e em seu corpo via-se o reflexo da emoção que se transformava em uma dança ou em um braço erguido estático ou balançando no ar. Em seu rosto via-se uma expressão séria ou uma alegria plena; o choro ou o sorriso. Foi uma artista completa que não se contentava com o mínimo e procurava sempre ir além, atravessando os limites.

Não era compositora, mas dava um toque pessoal às canções que interpretava. Rita Lee, em depoimento ao livro de Regina Echeverria, Furacão Elis, disse que a cantora também foi co-autora de sua música Alô, alô, marciano. A gravação que Rita enviou à amiga era em um ritmo diferente, mais acelerado. Elis transformou em algo tendendo para o jazz e com um certo deboche na voz ao falar da decadência da high society. Os autores, Rita Lee e Roberto de Carvalho, ficaram extasiados com o resultado. Rita também dizia que Elis cantava com todas as partes do corpo. Outro fato curioso também apresentado no livro foi quando Elis cantou o trecho inicial de Atrás da porta. A música de Francis Hime já estava pronta, mas a letra de Chico Buarque ainda não estava finalizada, e bastou a cantora colocar sua voz nela para o autor se inspirar e terminá-la na hora.

Muitas foram as músicas imortalizadas em sua voz e muitos compositores ficaram conhecidos graças a ela. O bêbado e a equilibrista, de Aldir Blanc e João Bosco, virou o hino da anistia. No Aeroporto de Congonhas, quando os exilados voltaram ao Brasil em 1979, havia pessoas carregando gravadores que executavam a música cantada por Elis e em coro cantavam juntamente com ela. Era uma grande honra ter música interpretada pela cantora. Ivan Lins disse que só quem a ouviu falar "vou gravar uma música tua" experimentou a emoção de ter a própria criação transformada por sua voz.

Como rei Midas, tudo o que a artista tocava virava ouro. Dedicava-se ao máximo em tudo o que fazia, da tarefa mais simples à mais complexa. Em 1977, dois meses após o nascimento de sua filha Maria Rita, foi cumprir um contrato com o Teatro Leopoldina em Porto Alegre, sua terra natal. Mesmo tendo um bebê em casa não rompeu o acordo. O respeito pelo público era tão grande, que resolveu não apenas fazer um show, mas criar algo novo. Assim surgiu o espetáculo Transversal do Tempo.

Elis Regina era assim. Nas tarefas domésticas e no cuidado com os filhos não era diferente. Em especiais de TV, João Marcello, seu filho mais velho, contou que sua mãe chegava tarde em casa após os shows e acordava cedo para auxiliar a empregada em seu trabalho. Gostava muito de cozinhar e de servir seus convidados. Quando Pedro, seu segundo filho nasceu, fez questão de se mudar para uma casa na Serra da Cantareira longe da poluição para que a criança respirasse ar puro.

Pode-se dizer então que essa brasileira foi não somente uma profissional magnífica, mas também um exemplo de pessoa a se seguir. Ainda é considerada a melhor cantora do Brasil, mesmo 30 anos após sua morte. É por isso que continua cativando novos fãs, fazendo lembrar o que escreveu Mario Quintana: "Um poema é de sempre, Poeta (...) Depois que tu te fores, alguém lerá baixinho e comovidamente, a vivê-lo de novo. A esse alguém, que talvez nem tenha ainda nascido, dedica, pois, teus poemas". Muitos dos novos admiradores de Elis nasceram depois de 1982 – ano de sua morte – e ficam encantados quando escutam seus discos. A obra de Elis Regina permanece viva tocando agora em novos artefatos tecnológicos, em aparelhos de CDs, DVDs, MP3 e sendo cultuada em redes sociais, além de diversos blogs e sites criados especialmente para ela.
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Brasil, um país racista

4.1.12
"Caíram em cima de quem disse que racismo de negro contra branco é justificável. Nenhum racismo é justificável, mas o ressentimento dos negros é".
Luis Fernando Verissimo (em defesa da ex-ministra Matilde Ribeiro, da Promoção da Igualdade Racial)

Estava conversando com uma cabeleireira sobre a ditadura da beleza. Um dos absurdos era a tortura que muitas mulheres se submetem para alisar os cabelos. Então, ela disse que sua filha, uma adolescente de cabelos cacheados, várias vezes foi questionada na escola o porquê de não fazer alisamento. A filha disse: "porque gosto dos meus cabelos assim e se quiser mudar um pouco o visual, peço para minha mãe fazer escova".

É quase uma obrigação, provavelmente é vista como uma aberração, assim como dizer que gosta de ler em um grupo de pessoas que detestam leitura.

Uma de suas professoras, uma imbecil completa, resolveu fazer um concurso de beleza na sala. Primeiramente, escolher a mais bonita já é uma cretinice sem tamanho, mas a professora (preciso continuar chamando-a assim?) resolveu ir além, era necessário eleger a mais bonita e a mais feia. Ganhou como mais feia a filha da cabeleireira, a que não segue a modinha, a que não quer ter os cabelos alisados.

Chegou em casa chorando. Sua mãe mostrou para mim uma foto no celular. Menina linda, magra, olha só, até segue o padrão de beleza, braços longos e finos, poderia ser modelo. Cabelos longos e cacheados, bem cuidados, nada de casa de ferreiro, espeto de pau, a mãe é cabeleireira, há de cuidar dos cabelos da filha.

A mãe respondeu: "você não ganhou por ser a mais feia da sala, você ganhou porque é negra". A filha então, no dia seguinte já estava melhor, porque como disse a mãe: "minha filha tem orgulho da cor de sua pele e de sua origem". Não teve como não me emocionar. Infelizmente são muitos que não se aceitam, não por culpa deles, mas dessa sociedade racista que tenta rebaixá-los, como aconteceu com essa menina.

Está enraizada na nossa cultura, precisamos mudar isso e os nossos colégios precisam de um melhor preparo, não só em conversas entre professores e alunos, como em conteúdos. Só temos a visão do europeu. Onde fica a África nos materiais didáticos? No meu tempo de estudante, não tive uma linha sequer da história da África. Foi preciso, em 2003, ser criada uma lei que obriga as escolas a ensinarem sobre a História da África e dos Africanos. Bem, essa é uma outra discussão que merece um post à parte.
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Relatos de uma professora incipiente I

1.1.12


Ah, as tão esperadas férias! Às vezes, mesmo amando o que fazemos, almejamos muito uma folga, fazemos contagem regressiva com o calendário nas mãos. Comigo não foi diferente, mas ao mesmo tempo que se aproximava o fim, também uma sensação de vazio ia surgindo, ainda mais na última semana em que tínhamos de fechar as notas e não havia mais a presença dos alunos no colégio. Escola sem aluno é deprimente, como dizia uma tia-avó. Então, chegaram as férias, mas aí me deu uma tristeza, uma vontade de dormir até mais tarde...

Porém, não posso deixar de registrar um momento importante. Houve outros, é claro, poderia escrever um livro sobre meus maravilhosos alunos, pessoas sensacionais, até mesmo aqueles que mais me estressaram, cada um possui algo único e ainda bem que tenho capacidade para reconhecer isso.

Para mim, o mais marcante foi ter conhecido pessoas diferentes na última escola em que lecionei, alunos, funcionários e professores, e deste último grupo, em especial a professora Sílvia, de História. Cheguei em setembro, final do 3º bimestre. Entrava na sala dos professores e só havia reclamação, cansaço, estresse. Era natural, mas não para a Sílvia. Sempre bem-humorada, tratando todos com muito carinho, chamando os outros de "meu amor", rindo das traquinadas dos alunos. Ela saiu um pouco antes de terminar o ano letivo, para tratamento médico e também porque havia saído sua aposentadoria.

No encerramento do ano, foi celebrada uma missa no auditório do colégio com a presença de professores e funcionários e a Sílvia foi homenageada. Muitos professores quiseram agradecê-la, contar o que aprenderam com ela, como havia sido a convivência com pessoa tão maravilhosa. Todos falaram bem, mas nenhum se expressou melhor do que ela: a própria Sílvia.

Esta professora de História pegou o microfone e deu uma aula de cidadania, educação e respeito. De início, ela falou que como educadores, líamos muito Paulo Freire, Maria Montessori, mas na prática, o que deveríamos levar em conta é que cada aluno é um indivíduo único, diferente dos outros e que não podemos padronizá-los. Disse que eles não são obrigados a gostar de sua matéria, muito menos do professor. No entanto, cada obstáculo vencido pelo aluno deve ser reconhecido pelo professor.

Falou ainda que, como temos quatro horas por dia com os alunos em sala de aula, temos muito mais influência do que a mídia, devemos saber utilizar dessa influência para transformar a sociedade em um espaço mais solidário, justo e igual porque estamos inseridos em um sistema injusto e cruel, o capitalismo. Contou-nos sobre um aluno que tinha uma dificuldade enorme em se apresentar em público e que depois de muito esforço, conseguiu apresentar um trabalho para a turma, o que a levou aos prantos. Lembrou-nos também de algo muito importante e que talvez a maioria ali presente tivesse se esquecido ou nunca quis aprender: estamos ali pelos alunos e eles são os mais importantes dentro de uma escola.

Tive oportunidade de trabalhar pouco tempo com essa figura maravilhosa, fico feliz de saber que há pessoas como ela, saber que ainda há esperança na educação. Ela, com seus sessenta anos, poderia estar desgostosa da profissão, desiludida por causa da indiscíplina, mas não, estava sempre disposta e talvez com ela nem houvesse bagunça em sala, devido a sua paixão e crença na educação, fizesse os alunos se interessarem. Ela nos faz crer que por meio da educação podemos transformar o mundo em um lugar mais íntegro.
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